As nossas memórias desempenham um papel crucial na forma como nos conectamos com a sociedade e com aqueles que nos cercam, sejam amigos, familiares ou até mesmo conhecidos. Elas não são apenas registros de momentos passados, mas também a base sobre a qual construímos nossas identidades, compreendemos o mundo e nutrimos relacionamentos significativos.
São as lembranças compartilhadas com amigos que fortalecem amizades, os momentos vividos em família que consolidam os laços e as experiências que acumulamos ao longo da vida que nos ajudam a empatizar com os outros e a encontrar o nosso lugar no tecido social. Sem elas, perderíamos parte da essência que nos torna únicos e que nos conecta uns aos outros. Afinal, o que seria de nós sem as lembranças que nos guiam, ensinam e acolhem em tempos difíceis? Elas são um reflexo do que somos e elo entre o passado, o presente e o futuro.
Sem as minhas lembranças eu não poderia escrever esta crônica. Nem poderia descrever as minhas experiências e muito menos falar sobre um grande companheiro que, acometido por uma doença cruel, perdeu grande parte da sua história.
Narciso Pereira Alécio(1939-) chegou a Santana do Ipanema por influência do irmão Arthur Alécio, que se radicou na região e se tornou empresário bem sucedido. Naturais de Pindoba, distrito de Viçosa, aos poucos a família migrou do Vale do Paraíba para o sertão na década de 1950. Um foi trazendo o outro até quando se percebeu, boa parte da família havia se tornado sertaneja. Ganhamos todos porque, no final das contas, o sertão foi reforçado pelas atitudes e o trabalho de pessoas de bem que continuam engrandecendo a terra e contribuindo para o desenvolvimento local.
Narciso, em 1964, foi aprovado no concurso do Banco do Brasil. Tomou posse em Santana do Ipanema e da cidade nunca saiu. A maior parte de sua carreira profissional exerceu o cargo de fiscal de operações rurais. No jargão bancário era conhecido como “Fiscal do Setop”. Uma das suas marcas era o bom humor e as soluções criativas para os problemas do dia a dia. Disso, eu fui testemunha quando convivemos, na mesma agência, na década de 1990. Era um abebeano colaborativo que prestou muitos serviços.
Seu biotipo corporal é magro, nunca foi diferente. Durante os seus exames periódicos sempre era recomendado engordar, confessava! Empenhado em seguir as orientações médicas e após o período de dieta balanceada rica em carboidratos e proteínas, retornou ao médico para mais uma reavaliação. E o resultado o surpreendeu quando o médico ao concluir uma criteriosa avaliação, deu-lhe a seguinte notícia:
- Seu Narciso, infelizmente sua dieta para engordar não deu certo como a gente esperava!
Narciso surpreso e risonho, indagou: - O que houve doutor ?
- O senhor engordou na região dos olhos, nas pálpebras e aí não vai lhe fazer bem. Nós vamos ter que retirar o excesso!!!
- Então, riram descontraidamente !!!
O bancário aposentado Manoel Oliveira Queiroz, o popular professor “Mané do Bode”, contemporâneo de posse em 1964, relatou que ambos viveram uma história futebolística engraçada. Narciso nunca jogou futebol, mas não perdia os eventos e uma boa conversa. O esportista Manoel sempre foi craque e defendeu, por vários clubes, as cores do futebol santanense.
No final da década de 1960, uma delegação de estudantes do Ginásio Santana foi convidada para uma partida de futebol contra estudantes de Palmeira dos Índios. Integrando a delegação estavam Narciso, Noé da Maravilha, Manoel e Denancy Queiroz, os dois últimos são primos e talentosos jogadores. Quando chegaram ao estádio, rumores corriam à boca miúda e alertaram ao time local de que na equipe sertaneja havia dois jogadores infiltrados que não atendiam aos critérios previamente combinados.
Então, nos bastidores, a delegação santanense para dissimular as suspeitas, acordou uma solução criativa: Fizeram constar da lista da escalação oficial os nomes dos atletas Narciso e Noé, que na verdade, eram Manoel e Denancy. Nem preciso dizer que jogaram bem e foram destaques. Durante o confronto a imprensa alagoana que estava fazendo a cobertura do jogo queria saber os nomes daqueles habilidosos atletas:
Narciso como um agente disfarçado atento a tudo, tomou a frente e de identidade trocada, adiantou-se e respondeu de pronto:
- Os craques da partida que vocês estão querendo saber são Narciso e Noé! Os caras são bons, rapaz!!!
Ao final da partida a reportagem divulgou a vitória da equipe sertaneja, destacando a atuação decisiva dos dois atletas.
Narciso se aposentou em 1994, após 30 anos de serviços. Atualmente aos 86 anos, o Alzheimer apagou parte da sua memória, mas preservou, sabe-se lá por qual razão, sua capacidade de continuar sendo brincalhão e engraçado como sempre foi.
O Alzheimer, em sua crueldade silenciosa, nos priva do que há de mais essencial em nossa existência: nossas memórias. São elas que constroem a ponte entre o passado e o presente, que moldam nossa identidade e nos conectam aos que amamos.
Sem nossas lembranças, perdemos a bússola que nos guia, os fragmentos que nos tornam únicos. Quem somos nós sem a narrativa das nossas vidas? Essa reflexão nos convoca a valorizar cada momento, cada memória, e a buscar empatia com aqueles que enfrentam os desafios dessa doença devastadora. Afinal, preservar memórias é também preservar a essência da humanidade.
Parabéns ao "mago véio" que completou idade nova hoje, 23/03/2025. Ele pode não saber quem ele é, mas nós sabemos!!!
Março, 2025
Que bela crônica para comemorar o aniversário do nosso querido mago véio,Narcísio Alécio.
ResponderExcluirParabéns Xará!!
Valeu Xará, grato!
ExcluirBelo texto pra essa figura histórica de Santana. Parabéns por contribuir com a história de personagens santanenses
ExcluirNarciso é uma figura!!!
ExcluirBelíssimo texto ! Muitíssimo bem escrito !
ResponderExcluirMuito bom conhecer essa história do Narciso . A crônica também nos traz conhecimento e cultura!
Parabéns João Neto
Mozart Brandão
ExcluirObrigado Mozart!
ExcluirBelo texto! Definições literárias de Narciso, da doença e do ambiente santanense, claras e objetivas.
ResponderExcluirParabéns, João Neto.
Abração.
Paulo Jorge Azevedo
Valeu Paulo !!!
ExcluirExcelente resgate da memória, dessa figura iluminada que é Narciso. Tive a sorte de conviver com seu bom humor enquanto estive em Santana, de 89 a 94. Que pena que a doença tenha-lhe apagado grande parte da memória, privando aos que lhe estão por perto de ouvir de viva voz as peripécias do magro.
ResponderExcluirFernando, mesmo sem saber continua fazendo os netos rirem. Até cantar está arriscando. Rs, rs.
ExcluirMais uma evidência de que ninguém sabe o valor de um momento até que se torne uma memória. Bela homenagem, meu caro escritor.
ResponderExcluirHayton, você tem toda razão.
ExcluirParabéns Narcio muita saúde e felicidades 👏👏👏👏👏🎂
ResponderExcluirVamos repassar aos familiares.
ExcluirLinda crônica. Parabéns . Para abrilhantar um pouco mais a história do amigo Narciso. Certa feita estávamos no Bar de Ze de Pedro e houve uma pequena discussão de que pesava mais : Narciso ou Renato França, e para resolver a contenta arranjamos uma balança e veio a definição Narciso ganhou com 01 kg a menos do que seu concorrente. Rsrsrsr
ResponderExcluirRs, rs, rs. Valeu Dr Júnior.
ExcluirNarciso Alécio, nosso "Mago Veio", goza de todas as prerrogativas conferidas por direito ao bom cidadão. A sua alegria e a capacidade de ser feliz, jamais serão superadas por este mal do esquecimento. O tempo vai passar, assim como passam as grandes tormentas, mas as chuvas que irrigaram o solo que você gradeou, apenas farão brotar as rosas dafelicidade
ResponderExcluirInfelimente, não consegui concluir o meu cometário. Feliz Aniversário grande amigo Narciso Alécio. Parabéns a você também, João Neto por esta belíssima crônica.
ResponderExcluirValeu, Grato.
ExcluirParabéns Narciso!
ResponderExcluirNosso amigo e colega de trabalho do nosso Saudoso Mardônio Barros ( meu esposo Nosso abraço!!!!
Valeu Ana!!
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