Tânio Barreto (violão) e Marcondes Costa no Teatro Deodoro | Reprodução |
Faleceu na madrugada desta quarta-feira, 16.10.2024, em Maceió, o médico, compositor e escritor Marcondes Benedito Farias Costa. Nascido em Viçosa, em 16.07.1947, Marcondes dividiu o seu tempo com a composição de belas músicas nos mais diversos estilos: xote, baião, forró, valsas, toadas e outros ritmos.
Psiquiatra formado em 1972 pela UFAL-Universidade Federal de Alagoas. Exerceu o cargo de diretor do Hospital Portugal Ramalho, onde desenvolveu trabalho de comunidade terapêutica. É autor de vários livros, dentre eles: “Loucura e Asilo”, psiquiátrico, IGASA, Maceió, 1976 e “Restos Diurnos”, poesias, Sergasa, Maceió, 1995.
Sobre o título “Restos Diurnos”, (1995) discorre seu irmão Marcos de Farias Costa: “... ferozmente freudiano, apita a razão vital de um dos autores, no caso, Marcondes, médico de profissão e psicoterapeuta por vocação. Sua poesia parece a “soma dos atos”, sua própria existência interior traduzida em criação artística. Lembra um aforismo da escritora aristocrática austríaca Maria Ebner-Eschenbach (1830-1916), que reza: “não é o que experimentamos, senão a maneira como sentimos o que experimentamos. Desce o pano.”
Autor de mais de uma dezena de canções, dentre as quais “Acordo às Quatro”, música que, merecidamente, caiu no encanto e foi gravada pelo Rei do Baião Luiz Gonzaga, em 1979, depois de ter sido incluída no elepê produzido pelo “Grupo Terra” em 1978, um grupo musical genuinamente alagoano.
Viola e Cavaquinho: Zailton Sarmento
Baixo: Messias Gancho
Flauta: Jorginho Quintela
Bateria: Cláudio Carlos
Vocais: Edson Bezerra e Eliezer Setton
Direção Musical, Montagem e Arranjos: Chico Elpídio
A canção foi incluída no elepê de Luiz Gonzaga de 1979, intitulado “Eu e Meu Pai”, pela gravadora RCA Victor.
Marcondes participou de vários festivais de música realizados em Alagoas nas décadas de 1970 e 1980.
Marcondes Costa fez parcerias com Tânio Barreto(Clique para ouvir), o mais constante parceiro, Marcos de Farias Costa, seu irmão, Chico Elpidio, Carlos Moura, Edécio Lopes, José Gomes Brandão, Juvenal Lopes entre outros.
Pelo que nos parece, a inclusão de Santana do Ipanema nos versos da composição não teve outra motivação senão a de se encaixar na inspiração do autor e a consideração pelos sertanejos, evidentemente. O acaso elevou ainda mais o bairrismo dos nativos e foi muito importante para a divulgação da terra.
Os santanenses reconhecem o legado do ilustre alagoano e se solidarizam com os familiares e amigos enlutados. Seu nome será sempre lembrado.
Acordo às Quatro, 1978 (Clique para ouvir)
Acordo às quatro, tomo meu café
Dou um cheiro na muié' e nas crianças também
Vou pro trabáio', com céu ainda escuro
Respirando esse ar puro que só minha terra tem
Levo comigo minha foice e a enxada
Vou seguindo pela estrada, vou pro campo trabaiá'
Vou ouvindo o cantar dos passarinho
Vou andando, vou sozinho, tenho Deus pra me ajudar
Tenho as miúças, carneiro, porco e galinha
Tenho inté' uma vaquinha que a muié' vive a cuidar
E os menino, digo sempre a Iracema
Em Santana de Ipanema, todos os três vai estudar
Pois eu não quero fio' meu analfabeto
Quero no caminho certo, da cartilha do ABC
Eu mesmo nunca tive essa sorte
Mas eu luto inté' a morte, mode' eles aprender
Eu mesmo nunca tive essa sorte
Mas eu luto inté' a morte, mode' eles aprender
É, menino meu tem que aprender
Nem que seja pelo antigo
A, B, C, D, E, F, G, H, I, J
K, L, M, N, O, P, Q, R, S, T, U, V
X, Y, Z!
Fi' de caboclo alagoano tem que estudar
Mode' eles aprender
Eu luto até a morte...
- Loucura e Asilo, Maceió: IGASA, 1976;
- Psiquiatria e Força (Imagens da Loucura), Maceió: Igasa, 1977;
- Poemas Circunstantes, Maceió: SERGASA, 1984;
- Aspectos do Sofrimento Humano, Maceió: SERGASA, 1981;
- O Psiquiatra e o Surto Psicótico, Maceió: 1984;
- Imagos, Maceió: SERGASA, 1986 (versos, capa de Valdeci Filho e Arte de Sebastião Alves);
- Atalhos, Maceió: SERGASA, 1988, capa de José Esdras Gomes ;
- Caçador de Versos, Maceió: SERGASA, 1989;
- Forró de Ossos, juntamente com Adller Sady Rijo Farias Costa, Maceió: SERGASA, 1993;
- Experiência Comunitária: Desenvolvimento do Posto de Saúde Mental de Chã de Bebedouro, juntamente com Maria Conceição Acioli Paixão, Maceió: Secretaria de Saúde e Serviço Social, FUSAL, 1983;
- Restos Diurnos, juntamente com Adller Sady Rijo Farias Costa, Maceió: SERGASA, 1995.
- Autor da canção (melodia e letra) Acordo às Quatro, composição gravada por Luiz Gonzaga, no disco intitulado Eu e Meu Pai, TCA Victor, 1979. Compôs Vida e Morte de Vaqueiro, juntamente com Francisco Elpídio e Eliezer Setton, gravado no CD Cio do Grão, de Eliezer Setton, em 1996;
- Classificou a música autoral Chorei, juntamente com Marcos Farias Costa e Robson Amaral Amorim, na Mostra do SESC, 2007.
Composições em elepês:
-"Morena você não cai" canta Aguinaldo Silva
-"Saudade Dói" canta Claudionor Gernano
-"Mereço seu perdão" Marcondes, J. Cavalcanti
-"Frevo gostoso" Marcondes e Tânio Barreto
-"Chão Quente" Marcondes e Juvenal lopes
-"Literatura de cordel" com José Cavalcanti
-"Noite Sertaneja" + C. Elpídio, Eliezer, P. Renault
-"Mote bem brasileiro" Marcondes,Tânio Barreto
-"Meu nordeste" + José Cavalcanti- grupo Terra
-"Meu sertão" + José Cavalcanti- Grupo Terra.
-"Rosinha" Marcondes e Marcos Costa- Pajeú
-"O cantador do sertão" + Tânio Barreto- Pajeú
-"Pense bem" Marcondes e Marcos Costa - Pajeú
-"Xote da recordação" Marcondes, Marcos Costa
-"Cego cantador" Marcondes e Tânio Barreto
-"Chora na Viola" canta Marcondes e Q. Vozes
-"Exaltação ao frevo" + Elpídio - canta Marcondes
-"Meu bem" + Juvenal Lopes, canta Gilberto silva
-"Acordo as quatro" canto Luiz Gonzaga
-"Pelo dia de amanhã" + Tânio B.- GrupoThrevus
-"Acordo as quatro" Pelo grupo Threvus
-"Os grandes do baião"+ Elpídio canta Eliezer
-"Xote da rosinha" Marcondes, Marcos Costa
-"O cantador do sertão" + Tânio B. , canta Tânio
-"Choro da despedida" + Ibys Maceioh
-"Homenagem a São João" + José Cavalcanti
Composições em cedês
Thelma Soares canta Marcondes Costa
-" Tristeza"
-"Gosto de Xote"
-"Noite"
-"Filho de violeiro" Marcondes e Tânio Barreto
-Disseram que eu dependo de você"+ Elpídio
-"Pra se viver" Marcos e Marcondes Costa
-" Solidão " com Chico Elpídio
-"Chorinho simples"
-"Vou tomar minha viola" + Marcos Costa
-Frevo da nostalgia"
-"RockXote"
-"Vamos Varrer"
CD - Confissões de um Boêmio
-"Pedestal do amor" Marcondes, Marcos Costa
-"Volta e meia" CD Somando amigos- Marcos
-"Pra se viver" + Marcos Costa por M. Costa
-"Vou tomar minha viola"+ Marcos Costa
-"Chorei" + Marcos, Robison Amorim
-"Um tango para Jaraguá"+ Marcos Costa
-"Você me alucina "CD forró bom + Marcos Costa
-"Pontal da barra" Marcondes e Marcos Costa
-"Acordo as quatro" canta Marcos Costa
-"Xote da Recordação " + Marcos Costa
-"Seca" Marcondes, Marcos canto Marcos
Site J.G. Brandão
-" Amigos da noite" Marcondes e Tânio Barreto
-"Choro o Choro"
-"Coco com C" Marcondes e Carlos Moura
-"Habeas-corpus" Marcondes, Tânio e Juvenal
-"Mistura com Farinha" Marcondes, J.G Brandão
-"Reencontro" Marcondes e Tanio Barreto
-"Tempos Antigos"
-"Valsa do Tempo" Marcondes e Tânio
-"Zé Arigó" Marcondes e Tânio Barreto.
Depoimento de Amigo:
MARCONDES COSTA, PRESENTE!
É natural e perfeitamente compreensível que alguém que se foi seja sempre saudado por seus méritos, feitos e virtudes, até mesmo quando suas qualidades no calor das emoções eventualmente apareçam aumentadas, digamos assim. Mas isso faz parte do ritual da bondade que aflora no contexto desse desconcertante fenômeno que é a morte.
Todavia, no que se refere a Marcondes Costa, que nos deixou esses dias, essa observação não se aplica porque aquilo que dele as pessoas disseram e tanto repetiram não eram apenas palavras de consolo, principalmente à família. Eram também constatações verdadeiras até mesmo pela ótica de quem com ele pouco ou só casualmente conviveu.
Marcondes era, de fato, um cara bondoso, generoso e solidário. E de um jeito que ele mesmo não percebia porque exercitava essas qualidades naturalmente, sem que isso interferisse no seu modo de ser inteiramente comum ao da maioria das pessoas, seja quando demonstrava alegria, desapontamento, tristeza ou qualquer outra coisa. Essa combinação se fazia possível porque intolerância e falta de cortesia não figuravam no seu dicionário de vida, seja como profissional ou pessoa.
Eu não gostava de abusar da amizade, mas nunca intercedi por alguém desvalido sem que Marcondes, como excepcional médico psiquiatra e estudioso, tenha deixado de atender e dedicar os melhores cuidados. E nesses casos especiais a abordagem dele era invariavelmente atenciosa, dedicada e competente como manda a ética profissional.
Essa generosidade do Marcondes advinha ou se completava com a sensibilidade cultural que compartilhava com a família talentosa da qual era herdeiro e a qual deu continuidade. Poeta e compositor, não somente se esforçava para divulgar as suas criações mas, como presenciei várias vezes, até contribuía com dinheiro do seu bolso para promover a produção de outros artistas, fossem eles da palavra ou da voz.
Coisas e atitudes simples dizem muito da pessoa. Marcondes aos domingos curtia uma predileção pouco comum: ia para os arredores do Mercado da Produção adquirir ou trocar antigos discos de vinil com colecionadores da música popular brasileira e nordestina. Sua coleção enchia não sei quantas prateleiras. E mais de uma vez, em ocasiões as mais diferentes, no meio de suas proverbiais distrações não era difícil vê-lo cantarolar coisas antigas totalmente absorto.
Isso acontecia sobretudo na casa dos meus pais, Tabita e Zé Alípio. Lá, como era hábito ancestral e muito nordestino de minha mãe, a mesa com café, bolos, doces e outras iguarias estava eternamente posta para qualquer visitante. Marcondes era um deles, sobretudo quando Volia, minha irmã, que morou anos a fio no Japão, onde também exercia a psiquiatria, viajava de Tóquio até Maceió para matar as saudades. Marcondes, embalado nas conversas, varava a noite naquela mesa comprida onde falava, ria e cantava com os muitos amigos e amigas que Volia atraía desde o momento que chegava. Minha mãe e Solemar, minha outra irmã, dedicavam a ele um enorme carinho.
Quanto a mim posso dizer que o humanismo do Marcondes era a grande qualidade que me fez seu amigo porque essa qualidade, imprescindível à essência - tão degradada atualmente - da nossa espécie, era o combustível do seu espírito, do conteúdo de sua arte, do seu posicionamento político democrático e da sua práxis médica. E foi tudo isso que motivou esse meu escrito porque há pessoas, como Marcondes, que deram sentido às suas vidas procurando proporcionar o mesmo às vidas de quem porventura cruzou o seu caminho.
Anivaldo de Miranda Pinto, jornalista
Outubro, 2024
Fontes de referência:
www.composal.zebrandao.com/compositor/14/marcondes-benedito-de-farias-costa
Acervo Misa, Digitalização; Dimas Marques
Portal 082 Notícias
Marcos Farias Costa
Claudevan Melo
Anivaldo de Mirando Pinto
Uma homenagem em forma de crônica ao autor da música " Acordo ás Quatro"
ResponderExcluirMarcondes Benedito Farias Costa, que faleceu na madruga de hoje.
Valeu, Xará !