Memórias fluem como um rio; ora turbulência, ora calmaria rumo à plenitude do mar das lembranças onde todos os eus se encontram. Seguindo o caminho intuitivo, encontro a antiga casa onde a família morava na avenida Nossa Senhora de Lourdes. A casa era pequena, mas suficiente. No miúdo quintal, num cantinho inservível, cresceu e prosperou uma frondosa goiabeira. Na minha introspecção e timidez ela me bastava de frutos e perspectivas.
Era o meu recanto. No topo dos seus galhos eu me amparava e tinha ao meu alcance, além das goiabas, amplos horizontes de onde se via praticamente todos os morros ao redor da urbe. Mentalmente eu me transportava para cada um deles e fora de mim, via-me no alto da árvore fazendo planos e promessas para mundo que me aguardava. E nesse ir e vir telepático tudo foi evoluindo, acontecendo e se transformando. Não foi tão rápido e fácil como nos planos, mas a jornada vale mais que o destino final.
Nos desafios de subir às serras eu aprendi muito mais sobre silêncios, persistência, adaptação, belezas e contemplações. Sem comparações com o êxtase dos versos arrebatadores que viram muito mais que eu: “Uma palavra caída das montanhas dos instantes desmancha todos os mares e une as terras mais distantes…”. Indescritível é a sensação de olhar livremente em todas as direções até tudo se perder. Na linha do horizonte onde tudo parece um, céus e terra se tocam, se entrelaçam e dançam aos sons dos ventos de maio.
O cimo das serras é solo sagrado, validado pela sabedoria popular que levanta uma cruz para sempre recordar da Vera Cruz. Onde o eu interior ganha relevância porque se aproxima ainda mais da sua essência. Se conhecer interiormente é vislumbrar o mais nobre propósito de vida, valores, escolhas e crenças para além das aparências. Cedo eu escolhi ser interior tanto nos propósitos, quanto nos caminhos a trilhar. A minha preferência por serras e montanhas não se limitou apenas ao meu torrão e atravessou fronteiras de alvorecer.
Há muito que o chão deixou de ser meu e a casa já não é a mesma. A goiabeira foi cortada para dar lugar aos concretos. Os montes, serras e montanhas, continuam lá como ancestrais vigilantes do vale da ribeira e da terra do sol embalando o povo com o som dos ventos quando os primeiros raios de sol despontam a aurora. Matutino, surge o menino com o brilho do sol venerando outro dia que chega.
Abril, 2024
Muito Bom. ...Bo. demais.
ResponderExcluirValeu, grato!
ExcluirPoético, reflexivo e instigante ao mesmo tempo. Acertou em cheio! Parabéns.
ResponderExcluirHayton, obrigado pela atenção de sempre!!!
ExcluirDebaixo dessa Goiabeira, fizemos uma Bateria de Papelão. E você pegou um velho cavaquinho do seu Pai. A gente brincava de tocar. Ali despertava nosso dom Musical. Bons tempos.
ResponderExcluirRapaz, era mesmo!! Bom demais!!!
ExcluirBelas reminiscências, João, transcritas em um texto poético fazendo jus a seu significado.
ResponderExcluirValeu Fernando, grato!
Excluir