O tocador de triângulo

 




   

Tampinha, apelido de Antônio Ferreira Neto(1958-2016), possivelmente recebeu a alcunha em razão da sua baixa estatura. Porém, pode ter sido pela abreviação do jargão “tampa de crush", termo regionalizado para exaltar as qualidades de alguém em alguma coisa. Depois, passou a ser chamado “Tampinha do triângulo”.


A grande paixão do servidor público era o forró pé de serra, integrando um trio composto de zabumbeiro, sanfoneiro e o percussionista. No carnaval era folião irreverente. Vivia com intensidade a festa momesca sem se desgrudar um minuto sequer do seu triângulo.


Tampinha do Triângulo

Destacou-se como um dos integrantes mais participativos do bloco dos cangaceiros, famoso grupo carnavalesco que desfilava pelas ruas e ladeiras rigorosamente caracterizados, acompanhado do trio sanfona, zabumba e triângulo. Foi brincante também do bloco carnavalesco "Os magnatas" com igual desenvoltura.

Tampinha era um percussionista dos bons. Qualquer festa era motivo suficiente para exibir sua performance no “triângulo”, nome popular de idiofone, percutido diretamente por um bastão - geralmente de ferro ou prego comprido -, sendo ele próprio, tocado de forma isolada. Possui o mesmo nome da forma geométrica que o representa. Normalmente é confeccionado de ferro e aço, mas pode ser feito de alumínio.

Possui timbre brilhante, médio agudo, e seu som é emitido pelas vibrações que são provocadas pelo bastão (ou baqueta), feita do mesmo material do triângulo. O tamanho da baqueta pode variar de tamanho, diâmetro e peso, conforme necessidade sonora.

O triângulo é utilizado em contextos variados. Há registros de uso na folia-do-divino onde os foliões consideram-no “um instrumento sagrado: tem três lados porque representa a Santíssima Trindade.” No meio popular, seu uso mais conhecido é visto nos gêneros regionais, principalmente nordestinos. Seja no baião, xote, arrasta-pé, xaxado, ele está presente, quase sempre acompanhado do zabumba e da sanfona, instrumentos característicos do conhecido forró pé-de-serra.

Embora os instrumentos já fossem utilizados no Nordeste nas festas populares, devemos a Luiz Gonzaga(1912-1989) a popularização da sanfona, zabumba e triângulo quando estreou seu grupo no Rio de Janeiro na década de 1940. Inclusive os componentes receberam os seguintes nomes artísticos: na zabumba, o mais alto; "Inflação" e mais baixo, no triângulo; "Salário mínimo".

Nas apresentações do trio forrozeiro, o Tampinha se destacava pela sua alegria, dança e extroversão nas tocatas. Sua marca registrada nos shows era dispor de um balde d’água que ficava permanentemente do seu lado. No auge da festa, empolgado e vibrante, mergulhava seu triângulo n’ água para resfriá-lo, por assim dizer, arrancando risos, efusivos aplausos e pedidos de bis da plateia.

Na pintura da parede da sala de exibição do cine alvorada o motivo também foi registrado.

Na década de 1990, o artista participou com êxito do Programa de Alfabetização de Adultos do Banco do Brasil - BBEducar, sob a coordenação das funcionárias voluntárias, professoras Maria Dionízio e Maria do Carmo, cujo evento de formatura aconteceu nas dependências da AABB.

Segundo Sebastião Malta, funcionário aposentado do Banco do Brasil, o músico integrou o trio forrozeiro que animou as comemorações juninas no saguão de atendimento da agência de Santana do Ipanema em 2003.



Parede da sala de exibição do cine alvorada


Num domingo de 2016, Tampinha saiu de casa e não retornou. Ficou desaparecido por dois dias. Foi encontrado morto, vítima de afogamento na barragem, trecho do rio Ipanema que forma uma lagoa. Encerrava-se a jornada terrena de um dos mais populares artistas. Uma perda inestimável para a cultura santanense.

Na vida tudo é passageiro. Num piscar de olhos se vive uma vida. Os caminhos percorridos e suas paisagens valem muito mais que o destino final. O mundo inteiro está na estrada ali em frente.






Henaldo Jr e Tampinha, folião irreverente
com o inseparável "triângulo".



Junho, 2022





Comentários

  1. Beleza, João Neto. Muito bom

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  2. Bom dia Xará!
    Mais um belo registro...
    Parabéns.
    João Neto Oliveira

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  3. Mais uma crônica para relembrar personagens que fizeram história, ainda que não se dessem conta disso. Será que o Cristiano Correia, funcionário da Super-AL, que também é um exímio tocador do instrumento, conheceu esse amante triangular?

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    1. Claro, sou contemporâneo do Cristiano, colega do BB. Uma figura folclórica no BB. Valeu!!

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  4. Muito boa! De fato, tampa de Crush (ou Grapette, Mirinda etc.) serve para designar algo raro nos dias de hoje que nos remete a um tempo bom. Parabéns!

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  5. Mais um registro de resgate de personagem Santanense que fez história na sua atividade.
    Parabéns, Xará, pelo registro.

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  6. Esse era do time de Cristiano Correia, também um amante triangular! Que bom que você vai resgatando figuras históricas santanenses, para deixá-las sempre presentes na memória.

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    1. Era mesmo Fernando. Inclusive fiz um complemento da participação do Tampinha no Programa de Alfabetização de Adultos do Banco do Brasil - BBEducar sob a coordenação das funcionárias professoras Maria das Dores, Maria Dionízio e Maria do Carmo. Feito o registro.

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  7. Themístocles Tavares27/06/2022, 22:31

    Artigo maravilhoso. Parabéns por tornar a lembrança de Santana do Ipanema eterna, com seus ícones e suas histórias. Muito agradecido.

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  8. O Tampinha (Cholinha para os mais íntimos), integrou o trio de forró que se apresentou na Agência do BB em Santana do Ipanema no dia de São João do ano 2003 (se a memória não me trai), com direito ao balde com água para "esfriar" o instrumento. E contrariando o Rei da Juventude na música O Divã, afirmo que "essas recordações me fazem bem". Parabéns Cabra Velho!

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  9. Dou testemunho de boas recordações do amigo e folclórico "tampinha" no bloco carnavalesco "Os Magnatas", ao tempo que parabenizo nobre escritor pela honrosa homenagem!

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