Lançamento virtual ocorreu 01.10.2021 |
Confesso que fui pego desprevenido com o honroso convite para prefaciar o quarto livro “Nossa história tem que ser contada”, do escritor Luiz Antônio de Farias, “Capiá”, associado efetivo da Academia Santanense de Letras, ocupando a cadeira número 01, cujo patrono é Adelson Isaac de Miranda. É inevitável dizer que a missão desencadeou um retrospecto interior em busca das minhas lembranças em sintonia com a vida e obra do autor. Oportuno se faz registrar que as nossas famílias têm laços afetivos de longa data. Enquanto adolescente frequentava a casa dos seus pais, Seu Zeca e Dona Aristhea, de saudosas memórias, acompanhado da minha irmã Maria Leônia. Nossas irmãs são amigas há décadas.
Outrossim, da sua amizade tão próxima com José Peixoto Noya (1943-2015), esposo de Maria Leônia, seria inevitável que o vínculo de compradrio tornasse solene a amizade e o respeito mútuo. Apenas isso, por si só já seria suficiente para justificar minha argumentação, contudo irei além: Em 1975 quando tomei posse na agência do Banco do Brasil como menor aprendiz, fui designado para integrar sua equipe de trabalho, que se chamava setin-setor interno. Com o saudoso Reginaldo José Raymundo, Nadinho (1949-2019), assumimos a condução dos trabalhos do almoxarifado da agência, como parte das minhas atribuições. Portanto, você e Nadinho foram meus primeiros superiores e, por conseguinte, mestres.
Luiz Antônio (Capiá)
Vidas se entrelaçam e se desatam no anonimato do destino porque são essenciais ao nosso equilíbrio e das gerações vindouras. Temos dificuldades em identificar a importância desses momentos vividos até que se tornem memórias. São as fragilidades incessantes das carências humanas que nos vendam os olhos.
Guiados por mistérios benfazejos os passos nos conduzem às pontes existenciais, atravessando os tempos de outrora, bebendo nas fontes transcendentais do riacho Camoxinga e rio Ipanema desde épocas imemoriais. Saciados, voltamos rejuvenescidos para divulgar, no tempo presente, histórias de pessoas e fatos marcantes que nos antecederam e que nos engrandecem. É clarividente que fomos chamados a uma missão: sejamos a mudança que almejamos, pois formamos parte de uma grande teia de raízes históricas que as novas gerações precisam conhecer e aprender a valorizar. Ninguém se identifica com o que desconhece. Façamos valer o instante e a oportunidade. Tudo está conectado.
A obra “Nossa história tem que ser contada” é uma exaltação à evolução do povo santanense, seus costumes e crenças. São temas recorrentes na sua literatura. Oportuno e pertinente é o registro da sua indignação com a falta de compromisso da maioria da classe política com o desenvolvimento dos sertões, visto que poucos avanços tivemos em tantas décadas de sucessivas secas. O que se vê, na verdade, é uma legião de oportunistas a serviço dos próprios interesses.
Quero fazer elogio a crônica “Santana do Ipanema – Terra de Escritores”. Convém citar seu argumento “... Jamais me imaginei ser alçado à condição de escritor, até porque minha ousadia não chegava a tamanho patamar.” João Guimarães Rosa, em sua obra “Grande Sertão: Veredas”, através do seu personagem Riobaldo, nos oferece grande lição quando diz: “Mestre não é quem ensina, mas quem, de repente, aprende...” Portanto, Capiá você faz jus ao título de mestre. É grande gesto reconhecer que somos seres inacabados e em constante aprendizado. Pois assim, verdadeiramente, somos.
Felicito-o pelo trabalho ímpar e hercúleo do levantamento genealógico da família em sua crônica “Nossa Árvore Genealógica”. Digno de nota. Raramente vemos algum trabalho similar. Até porque, para a maioria de nós, as lembranças dos nossos antepassados não sobrevivem muito tempo. Mentirei se afirmar que recordo o nome completo das minhas bisavós.
Não poderia deixar de destacar outra crônica marcante: “Zumbi dos Palmares – Santana do Ipanema em tempos de teatro”. Espetáculo de sucesso e de público que levou o grupo teatral a outras cidades pela qualidade dos textos, entrosamento e desempenho da trupe. Após citar períodos áureos do teatro santanense em diferentes décadas, o autor narra minunciosamente a peça teatral dos anos 60, de autoria do Cônego Teófanes de Barros (1912-2001), que eu afirmo se tratar do maior educador alagoano de todos os tempos. A peça de conteúdo revolucionário escrita há sessenta anos discorria sobre a extenuante saga dos africanos escravizados em busca da libertação dos grilhões.
Intelectual de inúmeras habilidades: padre, professor, escritor, compositor, teatrólogo, fundador de educandários, ginásios e faculdades. É fundador do Cesmac (1974). Inclusive, é autor das letras dos hinos a Senhora Santana (1947), encomendada pelo Padre Bulhões e a Senhora dos Prazeres, padroeira de Maceió. Também ajudou a fundar o Ginásio Santana (1949), Escola Técnica de Comércio São Tomaz de Aquino (1955) e Escola Normal Padre Bulhões (1956). Tinha estreita amizade com o povo santanense.
Só temos uma certeza na vida: onde estivemos e as jornadas que percorremos. Entretanto, nossos caminhos se unem e depois se separam de acordo com as exigências da vida. O que podemos esperar é que nos levem de volta àqueles que nos são importantes. Celebremos a estrada que nos trouxe até aqui. Tudo isso se resume na frase da crônica “Nossa Árvore Genealógica” quando o escritor diz: “... não tem como finalidade mudar o curso da história, porque ela já conta com a sua própria dinâmica.” Sabiamente, você disse tudo! Incertos são os destinos, porque vivemos à mercê da imprecisão das coisas.
Reconheço o mérito do argumento do jornalista Juan Arias que, em consonância com o tema, é apropriado citar; “Algumas vezes me perguntam a que recorrer, nesses tempos de pessimismo e desilusão com o presente. Os filósofos nos lembram que o refúgio sonhado não está no passado, que não é nosso e não pode voltar, como também não está na utopia de um futuro que ainda não existe. Seria uma fuga. A única matéria para modelar com nossas mãos é o presente, que devemos lutar para melhorá-lo porque é nosso e não temos outro.”
Sigamos com passos firmes e confiantes, as travessias temporais, fortalecidos pela imanência dos nossos ancestrais e a resiliência que faz superar obstáculos, trazendo e enfatizando vivências daqueles que nos antecederam. Devemos incentivar e trabalhar, sem trégua, para que o progresso dos santanenses seja tema de estudo na educação de ensino fundamental, instigando os jovens a despertarem o sentimento de pertencimento que nos faz agentes de ligação e defensores, unindo gerações. Oxalá as memórias sobrevivam. Seu livro já é parte do futuro.
Outubro, 2021
Contatos:
luizcapia@gmail.com
(81) 98894-1515
Parabéns! Um fragmento especial: “ Vidas se entrelaçam e se desatam no anonimato do destino porque são essenciais ao nosso equilíbrio e das gerações vindouras. Temos dificuldades em identificar a importância desses momentos vividos até que se tornem memórias. São as fragilidades incessantes das carências humanas que nos vendam os olhos”.
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