Segundo o padre José Valter da Silva Santos Filho, no livro “Memórias Religiosas de Santana do Ipanema”, em 1940, o Monsenhor Manoel Capitolino de Carvalho (1872-1942) escreveu sua autobiografia relatando os feitos na paróquia de Senhora Santana, cujo trecho transcrevemos: “... Fui em janeiro de 1897, nomeado vigário de freguesia de Sant’Ana do Ipanema, onde construí a Igreja Matriz e uma capela dedicada à Nossa Senhora da Conceição....”
Padre Manoel Capitolino era natural de Piaçabuçu. Chegou a Santana do Ipanema em 1898, deixando-a em 26.01.1919. Em 1914 foi eleito intendente(prefeito) e com o falecimento do professor Enéas Araújo em 15.01.1915, assumiu a chefia política. Bem relacionado na região sertaneja, elegeu-se senador estadual, cargo que ocupou de 1915 a 1922. No exercício da vice-presidência do Senado, governou o Estado de 01 de março a 12 de junho de 1921. Sancionou a Lei nº 893, elevando a vila de Santana do Ipanema à cidade.
Capela foi construída como marco de passagem do século XX, em 1899. Deu início ao povoamento do bairro e originou o nome “monumento”. A construção, com sua torre agulhada é herança dos castelos medievais. A porta, com adereços e linha no formato ogival segue características da adaptação popular do estilo arquitetônico revivalista que surgiu no século XIX e existiu até as primeiras décadas do século XX. Baseia-se na reinterpretação do estilo românico, vigente entre os séculos XI e XIII durante a idade média europeia.
Conta-se que o príncipe regente Dom Pedro II (1825-1891), encomendou ao escultor Arthur Berenguer, natural da cidade de Minho em Portugal, um lote de imagens de Nossa Senhora da Conceição. Anos depois foi proclamada a república, inviabilizando a entrega das imagens que ficaram guardadas no Museu Nacional no Rio de Janeiro até que o Bispo Dom Antônio Souza de Sá decidiu presentar as mais prósperas paróquias criadas do Nordeste, em comemoração à passagem do século, incluindo Santana do Ipanema.
A imagem veio de navio até o porto de Recife, chegando a Maceió no caminhão do exército brasileiro. Algum tempo depois, a viagem prosseguiu de trem até Viçosa. De lá até Santana do Ipanema no lombo de jumentos, seguindo os caminhos dos tropeiros e almocreves, chegando ao sertão no dia 15.11.1899.
Multidão para ver as cabeças dos
cangaceiros expostas nos degraus da capela em 1938
Embora haja fotografia da construção da matriz em 1912, em sua segunda reforma, os primeiros registros fotográficos da capela do monumento datam dos anos 30, quando já estava instalado o batalhão do II regimento para combater os bandoleiros. Em 1938, nos degraus da capela foram expostas as cabeças dos 11 cangaceiros do bando de Lampião mortos e decapitados na emboscada de Angicos em Sergipe antes de serem levados a Maceió.
Em 1950 a capela foi palco da recepção da imagem peregrina de Nossa Senhora de Fátima proveniente de Portugal que andou pelo Brasil.
A devoção ao orago de Nossa Senhora da Assunção está em torno da proclamação do Dogma de Fé da Assunção da Bem-aventurada Virgem Maria aos céus em corpo e alma. O dogma foi proclamado pelo Papa Pio XII em 1950 através da constituição “Munificentissimus Deus”. Durante séculos questionou-se se realmente a Virgem Imaculada teria morrido como todas as demais criaturas. Questionava-se se no derradeiro momento a Virgem teria adormecido como em um sono profundo e levada para junto de Deus em corpo e alma.
Recepção da imagem peregrina de
Nossa Senhora de Fátima proveniente de Portugal
É possível que a mudança da devoção de Nossa Senhora da “Conceição” para “Assunção” tenha sido feita pelo Padre Fernando Medeiros (1910-1984), que foi vigário de 1947 a 1951 ou pelo Padre Luiz Cirilo (1915-1982) que foi vigário de 1951 até 1982, visto que não há registros históricos. A imagem atualmente exposta na capela guarda semelhanças à Nossa Senhora da Conceição. A solução definitiva à dúvida é celebrar as duas festas porque honraria o testamento do Padre Capitolino, deixando a devoção como herança de fé ao povo sertanejo.
Até os anos 70 a festa era grandiosa com parque de diversão instalado na praça da capela. Dona Marina Marques foi zeladora durante muitos anos. Desde 2012, grupo de tropeiros das estradas, liderado pelo santanense Mozart Brandão Barros realiza a Cavalgada de Nossa Senhora da Assunção, refazendo o percurso original em seus cavalos e burros conduzindo uma réplica da imagem de Nossa Senhora da Assunção culminando com o encerramento do tríduo da festa celebrada pela Paróquia de Senhora Sant´Ana.
Outubro,2021
Marcelo André Fausto de Souza
e João Neto Felix Mendes
Foto: Jaelson Lima, 2021
Fontes de Referência:
A Freguesia da Ribeira do Panema, Medeiros, Tobias. – Maceió: Imprensa Oficial Graciliano Ramos, 2016. 2ª edição;
Memórias Religiosas de Santana do Ipanema, Santos Filho, José Walter da Silva 1ª edição – Santana do Ipanema, SWA, 2016.
Parabéns, João. Excelente pesquisa. Muito bem.
ResponderExcluirObrigado Bartô!
ExcluirMais um primoroso registro histórico. Parabéns, João.
ResponderExcluirObrigado Fernando!
ExcluirExcelente pesquisa sobre o Orago da Capela do Monumento..A origem da imagem da Santa, sobre o idealizador,Pe.Capitulino e outros detalhes importantes.
ResponderExcluirParabéns, João de Liô!!
Obrigado Xará !
ExcluirParabéns caro amigo e confrade João Neto Félix, por esse belíssimo relato que resgata tanto de nossa história, entrecruzando fatos históricos, eclesiais, políticos e sociais. Nossa Senhora tem mais de dois mil títulos, saber que aquela imagem que ficava em frente a minha casa paterna já foi chamada por duas invocações diferentes causou-me muita admiração. Minha mãe Dineusa Bezerra Campos (*1922-+2019) sentada à porta dizia: "da minha porta, consigo ver Nossa Senhora". Se sentindo privilegiada por isso, com relação a vizinhança. ass: Fabio Campos.
ResponderExcluirCaro João Neto, importante relato revelando a história. A foto da multidão olhando as cabeças dos cangaceiros ali expostas é sensacional. Parabéns.
ResponderExcluirObrigado.
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