Maria Izabel Gonçalves Rocha ( Dona Sinhá Rodrigues )

 


Maria Izabel Gonçalves Rocha
Sinhá Rodrigues




Dona Izabel nasceu em 07.04.1876. Ao contrário do que muitos pensam não era santanense, mas sergipana. Foi na capital Aracaju, onde estudou, coincidentemente na Escola Santana, uma das mais conceituadas da cidade. O mesmo colégio onde seus filhos também estudariam.

O tratamento de ‘Sinhá’ se popularizou a partir do casamento com o coronel Manoel Rodrigues da Rocha, que atualmente é o nome da praça defronte ao sobrado que no passado fora sua residência. Após o falecimento do marido em 1920 foi ela quem assumiu os negócios. Sua família negociava com tecido, couro e outros artigos.

A fama permaneceu a mesma. Não era em vão que a gente do sobrado tinha parentesco com o jurista Sérgio Loreto, Governador de Pernambuco. A casa do “coronel” continuava sendo como ele quis em vida – “o seio de Abraão” – hospedando governadores ou aventureiros, bispos ou vagabundos. A enorme sala de visitas “fim do império”, com cinco portas envidraçadas, no primeiro andar, abria-se para receber o Governador Costa Rego e o industrial Lionello Iona (Fábrica da Pedra de Delmiro Gouveia), da mesma forma que antes acolhera os governadores Euclides Malta ou Manuel Borba, o pioneiro Delmiro Gouveia e os arcebispos D. Sebastião Leme e D. Duarte Leopoldo. Mas também os humildes clubes carnavalescos da cidade, com fantasias de “morcego”, subiam as escadas do sobrado e dançavam livremente na ampla sala de visitas, desde a parede onde ainda estava entronizado o quadro do Coração de Jesus até outra de que pendia um belo espelho oval “biseauté”.

Como toda casa velha que se prezava, o sobrado também possuía os seus fantasmas. Os parentes e amigos da família contavam muitas histórias de assombração que ali se passavam na infância de Breno Accioly. Durante alguns meses, quando a família rezava em conjunto uma das novenas do calendário litúrgico – São Sebastião, São José, o mês de maio, Santo Antônio, N. S. do Carmo, Senhora Sant’Ana, mês do Rosário e a novena de Natal – uma voz misteriosa respondia à ladainha de Nossa Senhora – “Rogai por nós”. O Juiz de Direito atestou que ouvia esta voz grave e compassada: ia-se ver, mas a porta da escada continuava fechada, ninguém subia ou descia.


E quando a família deixava o sobrado para viajar, muitas pessoas da cidade aglomeravam-se de noite a praça fronteira para ver a luzes que se deslocavam por trás das cinco portas envidraçadas do primeiro andar. E havia discussão sobre a alma penada que aproveitava a ausência da família para povoar a sala deserta, fazer vibrar as cordas do velho piano ou acionar o veio do gramofone para que tocasse a “Serenata de Braga” ou a valsa “Nid d’Amour”, em antigas “peças” da Casa Edson Rio de Janeiro. Assim era o sobrado agora sob o comando da Sinhá.


Sobrado da família de Sinhá Rodrigues

Em 1928, numa tarde de carnaval, os artistas do circo armado defronte ao sobrado se confraternizavam com a população em festa. Uma “troça” improvisada quis homenagear o dr. Juiz de Direito, a fim de dançar na única sala de tacos encerados que Santana do Ipanema possuía. O enorme palhaço, o mesmo que andava de pernas de pau e montava de costas no jumento do circo, agradou ao menino Breno Accioly fantasiado de marinheiro e tomou conta do novo piano “Essenfeld” – o sobrado passou a contar com dois pianos - que o juiz presenteara à sua esposa.
A ousadia do palhaço teve êxito maior do que as músicas: aquele piano, que só se abria para que as leves mãos da sua dona tirassem melodias suaves ou acompanhassem o sopro da flauta do seu marido, recebeu percussões fortíssimas, que pareciam vir de um mundo bárbaro, em que havia sambas, marchas e foxtrote. Era, sim, mundo diferente aquele do hábil palhaço: o próprio piano se transformou ao seu contato. Dentro de pouco tempo, o sopro da flauta do juiz começou a ter novas ressonâncias: esposa e filho acompanhavam-nos a quatro mãos.

A matriz com o Senhor morto na Sexta-Feira Santa, o antigo cemitério do monumento, as bandas de música “Carapeba” e “Aratanha” (Breno era partidário da Carapeba), as sessões do Júri presididas por seu pai, o Juiz Manuel Xavier de Accioly, as evoluções da polícia, comandada pelo tenente José Lucena, alpercatas e chapéu de couro, as visitas de Lampião ao município (em janeiro de 1927, Breno foi mandado para a casa do Pe. Francisco Macedo, em Palmeira dos índios, por causa de Lampião), os enterros de defuntos pobres carregados em redes, as festas de Senhora Santana, com a zabumba recolhendo esmolas para o leilão de cada noite de novena, o teatro da “Agremiação Literária, Dramática e Beneficente”, agora sob a direção de Valdemar de Souza Lima, (o pioneiro do teatro, maestro Queirós já havia falecido em 1924) enfim toda a vida municipal de Santana do Ipanema no terceiro decênio do século estava sob o olhar discreto da matriarca Sinhá Rodrigues.


Sobrado comercial construído pelo Eng. Joaquim Ferreira
a pedido de dona Sinhá Rodrigues


Relatos orais contam que a construção do sobrado comercial na esquina da praça Senador Enéas Araújo foi uma encomenda da comerciante ao engenheiro civil Joaquim Ferreira da Silva. Anos mais tarde o prédio seria vendido a Zé Quirino. Atualmente o prédio pertence aos seus herdeiros.

Citação importante foi encontrada no livro “Santana do Ipanema conta sua história”. Trecho a define como “uma criatura simples, bondosa, amiga das famílias da elite santanense. A família mantinha serviço de apoio aos necessitados. Faleceu em 20.11.1966.
Em correspondência de 1980, Nilza Nepomuceno Marques, escreveu a Sílvio Nascimento Melo (Seu Silva) o seguinte depoimento: "(...) Dona Sinhá Rodrigues através do seu piano, trabalhos manuais e artes, transmitia seus conhecimentos as suas filhas e filhas do amigos e vizinhos, (como o caso de minha mãe e tias) ensaiando até peças de teatro em família, etc."


A Câmara de Vereadores criou com decreto de 2005, a comenda "Sinhá Rodrigues”. A honraria homenageia mulheres que se destacam.


Março,2021


Fontes de referência:

Texto publicado no Jornal do Comércio de Recife PE, em 27.03.1966, por Tadeu Rocha, jornalista e escritor. (Tio materno de Breno Accioly);
Melo, Floro e Darci Araújo, Santana do Ipanema conta sua história, Rio,1976;
https://www.alagoasnanet.com.br/v3/sinha-rodrigues-saiba-um-pouco-sobre-a-mulher-que-da-nome-a-comenda-do-dia-da-mulher-em-santana/
Relatos orais

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