Ipanema bem que podia ter sido Iguá-irá (Lenda sobre o Rio Ipanema), Fábio Campos

           

Rio Ipanema. Foto: Ariselmo Melo


             Agradecemos ao escritor e confrade Fábio Soares Campos pela gentileza em nos ceder sua crônica para publicação neste blog. Dividimos a mesma veneração e paixão pelo rio Ipanema e sua história. Dia 21 de Abril, dia do Rio Ipanema.


          Segundo o livro dos livros dos povos e nações indígenas, do mercenário alemão Hans Staden (XVI) a genealogia dos povos indígenas, tendo com tronco as quatro grandes nações: Tupi, Tapuias, Jês e Aruaques. São essas as doze tribos que povoaram os sertões de Alagoas, Pernambuco e Bahia; os Caetés (Kaa-ête), que gerou os Jiripancós, que gerou os Calancós, que gerou os Carapatós, que gerou os Cariri-Xocós, que gerou os Caruazus, que gerou Tingui-Botós, que gerou Xucurus-Kariri, que gerou os Pipipãs, que gerou os Pancarus, que gerou os Cantarurés, que gerou os Caimbés, que gerou a linhagem dos Fulni-ôs.

    O que vamos contar aqui, ouvimos da própria Amanacy, uma velha índia da última tribo mencionada acima, que ocupava a região dos vales da Catarina e da Borborema. Manacy explicou que seu nome significa “Senhora da chuva” porque vinha da sua descendência a capacidade da premonição e mesmo os rituais para fazê-las acontecer. Seu pai, era o curandeiro Amandy, que na língua nativa significa “Dia de chuva”.

    Dizia ela que, antes do homem branco chegar - era como o índio referia-se a fatos ocorridos antes do Descobrimento - toda a extensão do rio Ipanema desde a sua nascente na serra do Ororubá até sua foz no vale do Belo Monte, sempre existiu a tribo Fulni-ô habitando em diversos pontos, tendo como a taba principal, a que fora edificada às margens do rio nas encostas denominada Igara-cema que significa: “Águas Belas”. O grande chefe dessa nação era Itatiba que quer dizer “forte como uma rocha”- Essa história era passada de pai pra filho na língua Iatê –  outro chefe da tribo dos Caimbés que habitavam a grande região do vale dos Pipipãs, chamado de Ipojucã que significa “Senhor do trovão”, reuniu seus guerreiros e pintaram-se com as cores da guerra. Vieram combater contra os Fulni-ôs. Tinham intensão de se apossar das terras ocupadas por Itabiba e toda a extensão do atual rio Ipanema.

Rio Ipanema. Foto: Ariselmo Melo


    
    O dia do combate chegou. Tupã fechou os olhos pra não ver tanta atrocidade. Aracy, a mãe de Aram; o Sol pôs o seu filho atrás da grande nuvem. E Amandy deus da chuva quis por que quis acompanhar todo o duelo, do começo ao fim. Várias luas se passaram sem que aqueles povos pudessem ver Jacy, nem Guaracy. Só o choro de Tupã, por muitas luas.

    Muitos corajosos guerreiros tombaram sem vida. Tanto de um lado como de outro. Lutavam e lutavam nas trevas, no relampejar dos trovões. Muito sangue derramado, misturando-se a argila da montanha e a água da chuva. Diante da cena os índios repetiam:

-Ipiranga! Ipiranga!

Que quer dizer “rio vermelho”, rio de sangue. Mas o embate teve um fim. E o vitorioso foi Ipojucã. Ipojucã em combate capturou Itatiba. Amarrou-o a um tronco no centro da taba de Águas Belas. Cortou-lhe os pulsos para que sangrasse até a morte. Uma pequena cabaça, foi enchida com seu sangue, para que Ipojucã pudesse cumprir um ritual: Bebê-lo, mas somente com o raiar do sol. Os índios acreditavam que o guerreiro vencedor ao beber o sangue do guerreiro vencido, adquiriam sua força e poder.

    Jaçamin esposa de Itatiba cujo nome significa “Senhora das estrelas”, passou a noite derradeira, amarrada ao lado do marido agonizante. Quando os primeiros raios de sol se fizeram Jaçamin estava muito exausta e desfaleceu por cima da taça de sangue, a oferenda do holocausto. Acabou derramando seu conteúdo e este alcançou o rio.

Rio Ipanema. Foto: Ariselmo Melo

    Assim que o sangue de Itatiba atingiu o rio, a água passou a transformar-se. Mudando de alva como Jaçamin, pra morena, como a pele de Itatiba, mudando também em gosto, antes o sabor dos lábios de Jaçamin, agora o sal das lágrimas de Tupã. E o rio que antes, na língua dos índios, chamava-se, Iguá-irá que quer dizer “rio de água doce”, passou a amargo, salubre. Foi uma maldição lançada por Tupã, ao invejoso Ipojucã que se apossou das terras de Itatiba, a custa do massacre e do derramamento do sangue de tantos irmãos indígenas. E os índios, dali por diante batizariam de Ipanema, o rio da água ruim.


Fabio Campos 25/01/2011.


Fábio Campos é escritor e professor da rede estadual graduado em Licenciatura Plena em Biologia, e Bacharelado em Zootecnia pela UNEAL, Campus II, em Santana do Ipanema AL. Atualmente é colaborador dos portais www.maltanet.com.br; www.santanaoxente.com.br; www.sertao24horas.com.br; www.alagoasnanet.com.br e www.minutosertao.com.br e os blogs: fabiosoarescampos.blogspot.com e franciscosoares.blogspot.com




Março de 2021

Comentários

  1. Boa noite Xará!
    Bela transcrição...
    Parabéns prá você e pro Fábio Campos...

    ResponderExcluir

Postar um comentário