Arapiraca é uma variedade de angico-branco |
Não sei quantas vezes me perdi no meio de ruas desconhecidas e me vi sozinho entre tanta gente andando apressada de um lado para outro. Era mais um no meio da multidão. Além de mim, poucos transeuntes se aventuravam a sentar no banco da praça da prefeitura a conversar com os próprios pensamentos. Eu tinha consciência de que cada dia trazia consigo novas possibilidades e desafios, lavados com o suor sagrado do trabalho muitas vezes ignorado e banalizado.
Só eu sei
as esquinas que atravessei das ruas do centro, faminto de alimento e de crenças
na solidão da noite, após um dia estafante de trabalho mesmo acreditando que no
dia seguinte tudo seria diferente. Nem sempre foi. Como saber sem a indulgência
do risco? Todavia, nem tudo se ganha, nem tudo se perde. Tudo é questão de se
manter enérgico e perseverante ainda que sangrando no fio da navalha.
O
vale obscuro do pavor ainda tive de atravessar, mais de uma vez. Sem opção, verguei
meu medo com cuidado, repleto da suficiência que nutre a motivação do caminhar indiferente
às razões. Obliterei abismos reais e imaginários.
Como nada é pra sempre; nem as coisas boas, nem as ruins, aos poucos, os tempos das amenidades foram chegando e trazendo expectativas de dias melhores. Reiterei encontros despretensiosos com a dispersa gente valendo amizade. Vamos dar as mãos e cantar. O resumo é de cada um!
Música! A força que levanta os bailarinos reuniu
os fragmentos das minhas cinzas, aguada e fecundada pelo labor diário e então o
milagre se fez. A fênix-arara alçou o
voo libertador e soberano, sobrevoando o morro santo e o planalto das revigoradas
perspectivas, emoções e sentimentos até o pouso sereno na árvore de imensos galhos
abertos para o descanso revigorante. A música me salvou de mim mesmo.
Assim como eu a cidade evoluiu. Da rua do sol, passos nostálgicos se foram pra nunca mais. Ressurgiram passos largos que caminham nas manhãs da avenida do futuro. É tempo de contemplação das tardes no Itapuã, da beleza do pôr do sol e descortinar estonteante das noites enluaradas. O tempo mudou. O meu eu passageiro se libertou do encantado labirinto da dúvida. Decifrou enigmas, desprendeu-se e fincou raízes. Rabiscos se reescreveram, árvore se plantou e o rebento nasceu. “Essa Arapiraca, por enquanto, também é a minha casa”.
O
milagre já é estar aqui pra ser. Das dores, a paixão de amadurecer nas asas do
destino. Desamarrei a linha do horizonte na calmaria do limiar da senescência. O
que serei somente o novo arrebol revelará. Os fios dos cabelos pratearam, nasceram
rugas, adeus às fugas e às ilusões.
Quando
eu não estiver mais aqui, quero descansar à sombra do angico-branco do agreste
ou da craibeira do sertão, contudo não se engane, são meros devaneios e deslumbramentos.
Estou firme com meus dois pés no chão. Enfim, são tempos de serenidade.
Bom dia Xará!
ResponderExcluirCom requintes, traduziu um pouco da vida cotidiana do povo de Arapiraca e ainda colocou, de forma emotiva, o sentimento de quando você chegou aqui, que é e foi o sentimentos de todos nós que não somos nativos.
Parabéns e um abraço
Obrigado pelos comentários. Arapiraca também é a nossa casa.
ExcluirMais uma narrativa difícil de ler apenas uma vez, pela beleza de sua construção, o que nos faz relê-la de imediato e deixá-la ao alcance dos dedos para rebuscá-la mais tantas outras vezes.
ResponderExcluirParabéns pelo Certificado da ACALA e UBE.
Fernando, obrigado pela leitura e comentário.
ExcluirParabéns pela narrativa tão emotiva, que nos dar prazer em ler com se fossemos um personagem da mesma!
ResponderExcluirObrigado. Viver é uma experiência incrível !
ExcluirO bom do escritor é isso: a possibilidade de dizer coisas que outros "viveram", gostaram de ter "vivido", gostariam de ter vivido, ou vivenciaram coisas parecidas. Enfim, aos mágicos, os saltimbancos das letras nossos Parabéns. Parabéns! Amigo e confrade João Neto Félix, pela premiação, e pela escrita!
ResponderExcluirSinto-me lisonjeado com as suas palavras nobre confrade Fábio Campos. Obrigado, sinceramente.
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